02 fevereiro, 2010

INDONÉSIA IV

"22h00, 1 de Outubro de 2009, Pangkalan Bun, Kalimantan, Ilha de Borneo

Selama Malam

Apenas hoje soube de um grande terramoto na ilha de Sumatra e mal o meu telemóvel recuperou a rede, recebi muitas mensagens atrasadas a perguntar se estava bem. Fiquei muito sensibilizado com a preocupação de todos mas estive nos últimos dias bem isolado no coração do Parque Nacional de Tanjung Puting na ilha de Borneo e aqui não se fez sentir nada do terramoto. Felizmente não tenho histórias sobre a catástrofe mas apenas de mais uma interessante visita a uma parte da Indonésia.


Ocupando dois terços da ilha de Borneo, Kalimantan é uma das províncias da Indonésia que mais desperta a quem procura aventura. Montanhas, densas florestas, e longos rios marcam a cultura, a história, e o modo de vida da população. O que mais me chamou a atenção foi um Parque Nacional onde é possível encontrar várias comunidades de orangotangos, uma espécie única da Indonésia. Acabou por esse o meu único objectivo da minha apresada passagem em Kalimantan.


Mal cheguei a Kalimantan no aeroporto da cidade de Banjarmasin, procurei alguém para partilhar o Táxi e do Inglês rapidamente passei a falar Português! É a primeira vez que isso aconteceu em todas as minhas viagens. Nos destinos que tenho escolhido, são muito raros os viajantes portugueses, e desta vez também não fugi à regra. Quem encontrei mesmo foi um casal Espanhol de Valencia que em estudos e trabalhos passaram algumas temporadas em Portugal. Hugo e Cristina são ambos engenheiros florestais. O Hugo fez um trabalho de investigação na ilha Terceira e consegue falar um excelente português, com e sem sotaque Açoriano. Também é músico e cantor e até um fado e um Rap Açoriano eu ouvi deste lado do mundo! Muito inteligentes, muito divertidos e muito simpáticos, foram uma óptima companhia nestes últimos dias.


Banjarmasin é uma grande cidade instalada numa zona de rios e canais de água. Como tal existe muita vida em torno da água. Casas flutuantes, mercados flutuantes no meio do rio e muitos barcos fazem o transporte por entre a cidade. A visita à cidade foi mais curta do que esperava! Resumindo uma história complicada, deixei esquecido o meu telemóvel numa agencia de viagens e passei muito tempo até o conseguir recuperar. Já em Madagáscar tinha ficado com o telemóvel estragado depois de um banho de água do mar, e eu estava decidido em não o perder novamente. Não foi nada fácil até porque pouco podia fazer. Acabei por espalhar a mensagem a todos os que conheci de que estava disposto a pagar uma pequena fortuna para reaver o meu telefone. E mais tarde lá apareceu o empregado da agencia no meu Hotel. Ele já tinha jurado não ter visto o meu telefone e a maneira que arranjou para mo devolver foi bastante engraçada e ingénua. Ele disse-me que tinha um amigo muito inteligente que tinha conseguido descobrir a localização do telemóvel. E tinha um mapa desenhado que mostrava a localização a poucos metros da porta da agencia. Levou-me lá de mota e lá estava ele a tocar no chão! Eu agradeci-lhe e fui-me embora. Durante algum tempo recebi algumas mensagens dele a questionar-me pela recompensa! Para a próxima provavelmente ele já não vai devolver o telefone mas de uma maneira ou de outra, ele nunca seria honesto.


Finalmente no dia seguinte viajamos para Pangkalan Bun o ponto de acesso ao parque nacional de Tanjung Puting. Aqui tratámos de tudo para os próximos dias. O parque nacional é acessível apenas por transporte fluvial e são precisos alguns dias a subir o rio até os centros de recuperação e tratamento dos orangotangos. Apesar de remotas, as visitas já são uma rotina aqui e não foi difícil arranjar as permissões da policia, as entradas do parque, o barco e a sua tripulação, e a comida para todos.


A atracção principal são obviamente os orangotangos mas a a visita foi muito mais do que isso. O nosso pequeno barco subiu o rio lentamente por entre uma floresta densa e muitos animais desde crocodilos, borboletas gigantes, aves, e muitos primatas. Passei horas a fio na proa a contemplar este cenário sem nunca me cansar.







A vida a bordo também foi uma experiência muito agradável. O convés superior servia dos nossos aposentos onde a tripulação nos mimava com excelentes refeições. No apertado convés inferior, o capitão dirigia o barco, a sua esposa preparava as refeições, e o assistente do capitão tratava de tudo o resto. Um guia também nos facilitava a comunicação e nos acompanhou em todas as visitas. Nas noites calmas pescámos juntamente com a tripulação para grande entusiasmo do Hugo que é um habitual pescador.


O mais conhecido campo de recuperação é o Campo Leakey fundado em 1971 pela Dr. Galdikas, uma investigadora do Canadá. Agora os orangotangos são uma espécie bastante protegida mas durante muito tempo foram vítimas da desflorestação e da captura para serem vendidos como animais de estimação.


A investigadora Galdikas dedicou-se até hoje ao estudo desta espécie e em recuperar orangotangos capturados novamente para o meio selvagem. No entanto os orangotangos recuperados nunca se conseguem libertar totalmente do apoio do centro, e todos os dias a uma hora certa, alguns voltam para receberem uma dose de bananas e leite condensado. Realmente onde mais vão encontrar uma refeição tão doce no meio da floresta!


As horas de refeições são uma excelente oportunidade para ver alguns espécimes. Mas os orangotangos estão tão habituados aos humanos no Campo Leakey que passeiam livremente e convivem com os residentes a toda a hora. É impossível não ficar encantado com estes seres tão parecidos com os humanos!


Tão perto do fim da viagem, já não conto os dias mas sim as horas que faltam. Amanhã regresso à ilha de Java já em caminho para Jacarta. Mas ainda vou tentar aproveitar o último dia para visitar os templos de Borobudur."



Filipe Tavares



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